Mais de 60% dos utentes vão ao Serviço de Urgência Geral do CHL sem referenciação

Apenas 21,9% afirmam ter recorrido em primeiro lugar aos cuidados de saúde primários

Um estudo realizado recentemente na Urgência Geral (SUG) do Hospital de Santo André, unidade do Centro Hospitalar de Leiria, através de um inquérito realizado em janeiro de 2019, a utentes triados como não urgentes e pouco urgentes (pulseiras verde e azul), apurou que a maioria, 61,1%, se dirige a este serviço por iniciativa própria, sem recorrer aos cuidados de saúde primários (CSP). De facto, de acordo com este estudo, dinamizado por investigadores deste Centro Hospitalar em parceria com a Escola Superior de Saúde de Leiria do Instituto Politécnico de Leiria e com o ACES Pinhal Litoral, apenas 21,9% dos inquiridos afirmaram ter recorrido em primeiro lugar ao centro de saúde antes de ir ao SUG – e, destes, apenas 34% trouxeram informação clínica.
 
«Estes dados permitem-nos estudar a tendência dos comportamentos dos utentes no acesso às urgências, à semelhança do que fizemos num estudo idêntico no final de 2014. Verificamos que, à data de hoje, apesar da quase totalidade dos utentes ter médico de família atribuído, as diferenças são mínimas, e as melhorias pouco significativas: no final de 2014, 61,8% dos utentes dirigiram-se ao SUG por iniciativa própria e 18,3% foram primeiro ao centro de saúde, mas apenas 34% trouxeram informação clínica», explica Alexandra Borges, vogal do Conselho de Administração do CHL.
 
Este projeto tem como principal finalidade caracterizar o perfil dos utentes referenciados e triados como pouco urgentes e não urgentes que recorrem ao Serviço de Urgência Geral do HSA, bem como caracterizar o perfil dos chamados utilizadores frequentes (mais de quatro idas à urgência no período de 12 meses) e muito frequentes (mais de cinco idas ao SUG no período de um ano) a Urgência Geral. Identificar os motivos pelos quais estes utentes dão primazia aos serviços de urgência e não aos cuidados de saúde primários, e analisar o grau de conhecimento que um utente pouco ou não urgente tem sobre o funcionamento dos centros de saúde, são outros pontos da investigação.
 
Alexandra Borges revela que «temos vindo a realizar um trabalho de parceria com o ACES-Pinhal Litoral para, em conjunto, encaminharmos os doentes agudos para os cuidados adequados, quer sejam os centros de saúde ou hospital, e este estudo serve precisamente para monitorizar o tipo de utente, as suas motivações e as suas queixas e sintomatologia, para percebermos como podemos encaminhá-los».
 
O estudo revelou que 87,1% dos utentes não urgente e pouco urgentes que se dirigiram em primeiro lugar à urgência consideram que a sua doença justifica a ida à urgência, enquanto 52,6% revelou que “queria ser observado por um especialista”, 51,2% que poderiam, na urgência, “realizar os exames todos no mesmo dia”, e 46,4 adiantaram que “é difícil marcar uma consulta no centro de saúde”. 
 
Dos cerca de 18,3% dos utentes que se dirigiram primeiro aos cuidados de saúde primários, 60% destes fizeram-nos por ser “a forma correta de atuar”, e 51,7% porque “o médico/enfermeiro tem solucionado os meus problemas”. Estes utentes apresentaram maioritariamente como motivos para ir ao SUG: indisposição, dispneia (dificuldade em respirar), problemas oftalmológicos, problemas nos membros e dor abdominal. Dos 199 utentes inquiridos pertencentes ao ACES-PL, 96,5% têm médico de família, e 85,3% dos utentes inquiridos tem conhecimento da existência da consulta aberta do centro de saúde, sendo que 63% já a utilizou. 
 
Apenas 25,5% dos utentes se dirigiram ao SUG no período de 24 horas seguintes ao início dos sintomas. 
A análise revela que 37,8% teve alta para o médico de família/Centro de Saúde, 9,3% teve alta para o domicílio, e 8,5% para a Consulta Externa.
 
A equipa de investigadores conduziu ainda um estudo aos utentes hiperfrequentadores em 2018, que analisou o perfil destes utentes, e constatou-se que na totalidade das entradas no SUG os utilizadores frequentes representam cerca de 11% dos atendimentos, ou seja, 11% dos utentes vêm ao SU mais de quatro vezes no período de 12 meses.
 
Os utentes frequentes da Urgência (ano 2018) são maioritariamente aposentados e acima dos 64 anos, 45,7% foram triados como pouco urgentes ou não urgentes, e 64,3% foram encaminhados para o centro de saúde, a consulta externa, o domicílio ou equivalente no exterior. As motivações referidas são maioritariamente dispneia, indisposição, problemas nos membros e dor abdominal. Os utentes hiperfrequentadores da Urgência são principalmente os utentes isentos de taxas moderadoras, os utentes mais velhos, e os utentes não ativos.
 
A avaliação dos dados evidenciou ainda que 56.3% dos utentes pouco e não urgentes são do sexo feminino, 53% são casados, 37.4% tem apenas o 1º ciclo como habilitações literárias, e 37.9% estão reformados, enquanto 41,3% são ativos. 
 
«O recurso aos serviços de urgência de forma inapropriada é um problema comum em diversos países e Portugal é pior do que em muitos países, sendo uma preocupação constante, e motivo de reflexão dentro do SNS, principalmente quando verificamos que, ano após anos, as melhorias são pouco significativas», explica Alexandra Borges. 
 
«Importa assim, e cada vez mais, a articulação entre os níveis de cuidados, já que, segundo estudos já realizados, quanto melhor for essa articulação, menor será o recurso indevido da população aos serviços de urgência. É ainda relevante estabelecer campanhas que contribuam para aumentar a literacia da polução sobre a sua saúde, sobre a correta utilização dos serviços de saúde, sobre os riscos e o impacto da utilização indevida dos serviços, que impede que os recursos sejam alocados onde mais são necessários», realça a vogal do Conselho de Administração do CHL. 

2 de abril de 2019.