Alexandre Quintanilha falou de ética e evolução para uma plateia «ávida de o ouvir»

O auditório do CHL encheu para ouvir o reputado físico português
O reputado físico Alexandre Quintanilha foi o convidado do Centro de Investigação do Centro Hospitalar de Leiria (CI/CHL) para abrir o ciclo de conferências que debate temas atuais e pertinentes para a investigação em medicina. O professor jubilado do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, atualmente deputado na Assembleia da República, falou dos desafios atuais em biomedicina num auditório sobrelotado, uma plateia de profissionais de saúde «ávidos de o ouvir», nas palavras do coordenador do CI, João Morais.
 
Alexandre Quintanilha abordou alguns dos temas mais fraturantes em biomedicina, a área das ciências biológicas vocacionada para a pesquisa e investigação na área da saúde, dando exemplos recentes como a manutenção fisiológica de uma mulher em morte cerebral, permitindo que o seu feto vivesse, com um caso conhecido em Portugal, mas com casos noutros pontos do globo; a manipulação e edição genética para que crianças nascessem com material genético de três pessoas, eliminando assim doenças genéticas fatais ou neurodegenerativas; ou a utilização de inteligência artificial, referindo o caso de uma mulher tetraplégica que comanda, através do pensamento, um robô, com recurso a chip implantado.
 
Estas e outras questões foram o mote para uma conferência dedicada essencialmente à «inovação social», nas palavras do preletor, que confessou querer que a plateia saísse do encontro «com mais perguntas e dúvidas do que com respostas».
 
Dando como exemplos de inovação social recentes a abolição da escravatura, a assunção dos direitos das mulheres e da liberdade religiosa, que classificou como «conquistas frágeis, ainda não garantidas em muitos sítios», Quintanilha garantiu que a educação é a forma mais antiga de alterar maneiras de pensar e de ver o mundo. Para o convidado do CHL, a educação é a base destas transformações no mundo, destas inovações sociais, que por norma geram sempre fascínios e medos.
 
E questionou, à luz dos exemplos fraturantes que havia referido anteriormente: «Estaremos a brincar aos deuses? A ir contra a natureza? Estaremos a criar diferenças sociais com base nos genes? Estaremos a fomentar a eugenia?». Para depois questionar em sentido inverso: «Não foram já as transfusões, as vacinas, a pílula, os transplantes ou a procriação medicamente assistida vistos como contra o que é natural?».
 
Sempre em tom provocatório e com uma postura questionadora, Alexandre Quintanilha questionou a plateia: «Não devem os pais querer o melhor para os seus filhos? Querer assegurar-lhes uma série de “vantagens”, como uma nutrição saudável, educação, um ambiente familiar estável? E não deverão esses mesmos pais promover vantagens de outro tipo, como genéticas, protegendo-os de doenças que são garantidas?».
 
O professor foi ainda questionado pela plateia sobre a morte medicamente assistida, outro tema fraturante, que considerou ter de haver um debate importante, e esta é uma questão muito séria, e que, a acontecer em Portugal, deve ter muita regulamentação e acompanhamento. Reconhece que é, no entanto, uma realidade que acontece em todo o mundo, de forma escondida, envergonhada e com medo de repercussões.
 
Ainda sobre a eutanásia, levantou questões como o facto de a vida da pessoa depender da vontade de outros; de até que ponto deve um profissional de saúde lutar para manter uma vida, por apenas mais alguns dias, a custo da qualidade de vida do doente; onde está a fronteira entre vencer a doença e estar a prolongar uma vida com menor (ou nenhuma) qualidade. Acentuando a complexidade das questões em cima da mesa, Quintanilha sublinhou que «os profissionais de saúde são diariamente confrontados com dilemas para os quais não há respostas simples».
 
Na reta final do encontro, João Morais destacou o «encanto» que é ouvir «as brilhantes intervenções do professor Quintanilha», reflexões que ajudam a mudar perspetivas, e que certamente influenciarão muitos dos profissionais do CHL. Maria Guarino, investigadora do CI e docente do Politécnico de Leiria, questionou o convidado sobre como podem os profissionais de saúde superar o desafio de, com a atividade assistencial que têm de prestar atualmente, ainda contribuir para criar conhecimento e investigar. Para o convidado do CI a receita é “simples”: «Façam as coisas completamente diferentes do que é esperado. Façam perguntas fora da caixa». «A investigação em biomedicina pode ser muito frustrante mas também é muito gratificante. E quando olharem para trás, vão ver que valeu a pena» rematou.
 
22 de janeiro de 2018