Medicamentos que não fazem dormir

Falemos de Saúde Mental: Medicamentos que não fazem dormir

Na rubrica anterior – Triste ou deprimido? – vimos a diferença entre tristeza, uma emoção normal que pode surgir perante situações de vida difíceis, e depressão, uma doença mental grave que inclui um tipo de tristeza profunda e incapacitante. Alertamos também que, perante uma depressão, é essencial pedir ajuda e que existem tratamentos farmacológicos e psicoterapêuticos disponíveis. Falemos, pois, sobre um dos efeitos menos esclarecidos dos medicamentos usados pelos psiquiatras: a sedação.
 
“Doutor/a, não quero medicação que me ponha a dormir, por favor!” – este é, talvez, um dos pedidos mais comuns que os psiquiatras ouvem dos doentes quando chega o momento de falar sobre o tratamento. De facto, a ideia de que a medicação para as doenças mentais funciona “acalmando os nervos” e, portanto, deixando a pessoa muito sonolenta, sedada e como se fosse um zombie, é uma das (muitas) ideias erradas que ainda prevalece sobre o tratamento da saúde mental. Tentemos esclarecer.
 
Devemos admitir que a ideia é compreensível, embora errada. De facto, no passado, muitos dos fármacos da psiquiatria, incluindo os antidepressivos – ainda numa fase inicial de desenvolvimento (o que, de resto, é verdade para muitos medicamentos de todas as áreas da medicina) – tinham como efeito secundário frequente a sedação. Assim, era frequente que pessoas que estivessem a tratar a sua depressão ou ansiedade ficassem sonolentas e um pouco lentificadas, já que os fármacos da altura causavam sono.
 
Também no passado, os medicamentos usados na esquizofrenia, chamados antipsicóticos, causavam muito sono. É preciso lembrar que esses eram os melhores medicamentos disponíveis na altura e, na realidade, ajudaram muitos doentes. Porém, mais uma vez, entorpeciam os doentes. Desses tempos ficou a imagem do doente mental apático e “apagado”.
 
No entanto, muita coisa mudou (e muito!). O perfil de tratamento e dos efeitos secundários dos medicamentos foi extraordinariamente melhorado. Na verdade, usando o tratamento da depressão como exemplo, os antidepressivos modernos não só não dão sono como ajudam a pessoa a sentir-se menos triste, mais desperta, serena e com energia para enfrentar o dia-a-dia. Inclusive, ajudam a ficar mais desperto durante o dia e a dormir melhor à noite! Além disso, alguns medicamentos mais antigos ainda podem ser usados precisamente porque… dão sono! – sendo muito úteis no tratamento da insónia. 
 
O receio dos medicamentos psiquiátricos é compreensível, mas errado. Se precisar de um desses medicamentos peça ao seu médico de família ou psiquiatra que esclareça como é que o fármaco vai actuar. Lembre-se: a doença mental existe e pode ser grave, mas há muito que se pode fazer. Fale com o seu médico sobre a medicação e… relaxe.


Artigo elaborado por:
Daniel R. Machado
Interno de Psiquiatria do Centro Hospitalar de Leiria

(Rubrica “Falemos de Saúde Mental”, publicada mensalmente no Diário de Leiria)